sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Raízes rasas


Eu nasci numa manhã de lua
Guardei a alma minha, fiquei com a alma sua.
Os ventos movimentavam o caminhar da moça
Ela chorava, e caminhava devagar.
Com seu triste aspecto de dor, ela sorria.
E dava mais um passo, gritos desafinados.
As borboletas coloriam a rua deserta
A moça, a face avermelhada.
Beleza escondida sob as gotas de suor
As mãos apertavam abaixo dos seios fartos
E às vezes, assimétricas se juntavam
Próximas aos joelhos, a moça se encolhe.
E levanta a cabeça, e chora, apertando os dentes
Ainda vermelha, suada, doce e dolorida, sorri.
Sempre soube a dor de gerar vida
Encostada numa árvore de caule fino
E galhas desnutridas, calva de folhas.
Assusta-se com a intensidade dessa dor
Gargalha, se ajeita entre as raízes rasas.
Que se relevam da terra, e marcam o chão.
Saem arrastadas desenhando as linhas do destino
Dos que aqui estiveram, dos que estão, dos que virão.
Trazem nelas todas as marcas de vida, unhas de animais.
Rastros dos cupins e formigas, rachaduras.
Passagens que se dividem em duas, e seguem se dividindo.
E essas raízes que agora machucavam
O corpo da moça.  Vão demarcando a pele
E construindo um sentido pra todos os seguintes movimentos
O encolhimento depois da dor, depois o alívio.
Que a fez se estirar.  E com as costas das mãos.
Tocar novamente a roseira, fazendo voar as borboletas
Arranhando-se contra os espinhos
Entre a madrugada que se arrastava
E a manhã que se anunciava
Através da cor do céu, réplica.
Réplica da cor das têmporas da moça
A lua que não queria ir embora.
E roubava sem o mínimo pudor o lugar do sol.
Estirou até minha face um raio doce como os açúcares mais finos.
E tão iluminado quanto a auréola de um anjo pecador, cuja
Beleza e simplicidade são superiores a qualquer ouro
Mesmo o vindo dos céus, honesto e batalhado.
E o clarão da lua ao tocar minha face, cerrando meus olhos.
Colocou-me no escuro eterno. E me carregou pra junto dela
E hoje pra me expressar e sobreviver no milagre da palavra
Coloco-me na pele de um garoto, quase inexpressivo.
Com nuances de morbidez e alienação
Que convive entre o suave e o proibido
E se rende aos meus encantos
Deixando que eu use o seu corpo (voz e mãos)ao meu bel prazer
Porque eu não nasci anjo
Mas a luz, assim me fez.
E quando for expulso do corpo que uso e abuso.
Eu morrerei numa noite de sol
Levarei suas roupas, pertences, seu cachecol.

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Abaixo da Auréola

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A fonte de inspiração que sobrevive aos borrões da cor, a lua que não encontra o sol e mesmo assim depende dele pra se manter clara,a alegria de um poeta ao ver a flor que molda as mais belas palavras e as sintoniza, criteriosamente, para que os admiradores sufoquem-se de beleza, inspirem-se e sonhem, cada dia, mais e mais, eu sou o portador da beleza que há nas palavras.